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Ana Pais

Ana Pais SiteGostava de escrever para o futuro e sobre o quanto tenho fé vais ser muito mais feliz e concretizada do que muitas crianças quando se tornarem adultos.
Que concretizaste o sonho de seres atriz de teatro e que a tua veia de influenciadora de massas teve os frutos desejados nos projetos que idealizas.
Mas o desafio para escrita deste ensaio é sobre as nossas vivências com as doenças reumáticas da infância.
Assumiste o teu papel com naturalidade como se esse fosse o teu o papel principal. Nunca encaraste a AIJ como uma luta, a tua perspetiva sempre foi de aceitação.
Frases como: “O Sol amanhã pode voltar a brilhar”, como se traduzisse numa forte possibilidade de não ter dores; ou “Não estás sempre a dizer que o mais importante é saúde, então não ligues a isso”, quando estavas a relevar a importância de não conseguires escrever na primeira aula da manhã e atrasares a fazer o sumário que a professora pedia. Até mesmo, uma explicação sobre as diferenças entre estar doente e ter a atrite, ou em cada crise cíclica que aparece, tu explicas-nos que é “só mais uma crise e vai passar como todas passaram” ...
As tuas palavras sempre soaram a lição de vida, e pareciam proferidos por um velho sábio, mas saiam de uma miúda de tenra idade. Um dia perguntei-te se tivesses uma varinha mágica, que desejo pedias e tu respondeste: “Quero ter a certeza de que vou ser atriz de teatro”; eu exclamei: “Pensei que pedias para não ter artrite”. Tu respondeste: “Essas questões não se colocam. É aceitar e não questionar muito. A doença não me condiciona de ser feliz”.
Um diagnostico de uma doença cronica num bebé de 14 meses, não é fácil de aceitar. Nessa fase, os pais têm sonhos, idealizam o melhor para os seus filhos. A grande maioria dos pais, e ainda bem, estão preocupados em condizer a roupinha com o laçarote, ou um pingo no nariz. Nós tínhamos de lidar com o choro doloroso numa muda da fralda, ou com os gemidos sofridos de dor em longas noites. Lembro-me de algumas vezes, chegar com os braços dormentes ao trabalho e massajar para os sentir, tal era o meu esforço para demitir-me de sentir e ter coragem de despir o pijama da minha bebé de vesti-la de novo.
Mais para a frente procurei estratégias para as manhãs difíceis de rigidez matinal. Todos os dias as minhas filhas eram acordadas com música animada e movimentos nos punhos e dedos aludindo a magia com brilhantinas e purpurinas.
As nossas vidas foram povoadas de muitas consultas de várias especialidades, analises, injetáveis, infiltrações, fisioterapias, terapias ocupacionais, e batas brancas, ao invés de viagens como sempre sonhámos e passeios no parque. Mas, é bom saber que a medicina e a ciência evoluíram tanto que existem todas estas possibilidades de controlar a evolução da doença e dar uma boa qualidade de vida a um filho.
A minha filha tem uma vida muito ativa desde sempre, o desporto sempre fez parte da sua vida e a fisioterapia a par da terapia ocupacional foram muito importantes na primeira infância.
O apoio dado pela família alargada foi essencial para conseguirmos estar à altura do desafio. Numa consulta de fisioterapia, a terapeuta ensinou-nos que cada membro da família devia partilhar responsabilidades, e que os avós eram essenciais. E assim fizemos, hoje olhando para trás, sinto que foi o melhor que podíamos ter feito, para normalizar a vida e aprendemos que a dor partilhada é dor aliviada.
A Diana foi crescendo e hoje ao olhar para trás, não sei como aguentamos tanta incerteza, e dor no coração. Pior que isso é ver um filho com dor e ainda não saber queixar-se por ser tão bebé e ainda não falar. A Diana há poucos anos, confessou-me que se lembrava de gatinhar com dificuldade por lhe doerem os joelhos. Claro que acabámos as duas em choro; eu porque me partiu o coração escutar semelhante afirmação, e ela por saber que eu não estava preparada para este momento. Sinto que algumas fazes foram tão dolorosas que a minha mente as apagou para me proteger, mas outras tenho bem guardadas na minha memoria e no coração.
Quando a Diana fez quatro anos, conhecemos a ANDAI, que foi decisiva nas nossas vidas, desde o apoio que nos deram, à partilha de pares, de pais e crianças. Os nossos dias passaram a ter outro significado, e foi dessa forma que também comecei a ajudar outros pais, e a minha dor começou a ficar em perspetiva. Para além do meu trabalho como consultora de telecomunicações, tornei-me acolhedora de famílias que chegavam à associação e que precisavam de informação, apoio e um ombro amigo.
Os dias, transformaram-se em anos e hoje tenho funções de presidente de direção. Aprendi muito e tornei-me uma ativista da, e pela saúde. Apelidam-me de “arquiteta de sorrisos e esperança”, porque é com determinação e estes valores, que temos que acompanhar os nossos filhos e todas as crianças e respetivas famílias.
Assumi como meu, o papel de apoiar e promover a literacia em saúde sobre esta temática. Faz-me sentido ter um papel ativo, já que todas as mulheres da minha família direta têm uma doença reumática.
Não posso deixar de aproveitar esta oportunidade de através deste ensaio, defender os meus ideais e propostas para conseguirmos melhorar o apoio às crianças com doenças crónicas e suas famílias, exigindo uma abordagem integrada e centrada nas suas necessidades específicas. De todas as iniciativas que defendo, elejo uma que pretendo destacar que é a Participação das famílias nas decisões: Incluir as famílias e associações de apoio às crianças com doenças crónicas no planeamento de políticas e serviços.
Os decisores políticos devem garantir que estas medidas sejam implementadas através de investimentos robustos na saúde, educação e proteção social, assegurando que as necessidades específicas destas crianças sejam tratadas com prioridade. Assim, será possível criar um sistema mais equitativo que lhes permita alcançar todo o seu potencial.

Ana Pais, 2024
52 anos, Mãe

Profissão: Consultora Sénior de Telecomunicações
Presidente Direção da ANDAI
Estado Civil: Casada
Natural de: Lisboa
Passatempos: Voluntariado, desporto, dança.
Tive conhecimento do prémio Edgar Stene através da divulgação por parte da LPCDR nas suas redes sociais. Decidi aceitar o desafio de participar como forma de sensibilização e como um testemunho de uma cuidadora para os seus pares.
Defino-me como arquiteta de sorrisos e de esperança, bem como ativista pela saúde, porque desde que me associei à ANDAI encontrei a felicidade de partilhar e apoiar outras famílias nesta jornada que é a vivencia com as doenças reumáticas na infância. Tenho sempre uma mensagem positiva e de esperança na conquista da qualidade de vida das nossas crianças e jovens.

(texto conforme o original)