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Bruna Correia

Bruna Correia SiteDesde que fui diagnosticada com Artrite Idiopática Juvenil (AIJ) aos 8 anos, a adaptação tornou-se a palavra-chave da minha vida. Na infância, brincava como as outras crianças, mas com cuidados especiais para evitar dor e crises. Sempre refletia antes de qualquer atividade: "Será que isso vai causar dor? Vale a pena arriscar uma crise?" Mesmo assim, brincava, mas com ajustes, como jogar à apanhada apenas na baliza, para não fazer tanto esforço. Quando me sentia bem, até tentava ser avançada, embora preferisse a posição de guarda-redes.
Na escola, o apoio dos meus colegas foi fundamental. Como estive com a mesma turma do 1º ao 9º ano, eles acompanharam o meu diagnóstico e perceberam que eu não estava a “fingir” a dor. Eu explicava-lhes a minha doença de forma simples, como no 6º ano, quando relatei que o meu corpo estava a ser atacado por vilões nas minhas articulações e que precisava de “super-heróis” (medicação) para me acalmar.
A aceitação na minha família foi um processo gradual. Inicialmente, qualquer pequeno incidente parecia um grande problema, mas com o tempo, perceberam que eu precisava de viver normalmente e que a dor era algo que eu tinha de aprender a gerir sozinha.
A maior dificuldade que enfrentei na escola foi na disciplina de educação física. Muitos professores não compreendiam a doença e achavam que eu estava a inventar as dores. Em um ano, tive insuficiente porque estava em crise e não conseguia fazer os testes de resistência. Achei injusto, pois se um colega se lesionasse, bastava fazer um trabalho para compensar. No meu caso, tive de fazer vários trabalhos, arbitrar jogos, realizar os exercícios que poderia fazer e ainda assim não conseguia tirar mais que um "suficiente". No entanto, esses obstáculos ajudaram-me a desenvolver uma grande persistência.
Outro desafio era conciliar as consultas com os testes. Se os professores compreendiam a necessidade das minhas consultas, ajustavam as datas, mas, caso contrário, eu tinha de pedir à minha diretora de turma para interceder, o que me deixava desconfortável.
Agora, na faculdade, consigo ajustar os horários das consultas, mas a minha doença torna-se mais impactante durante os estágios clínicos. No início, tive dificuldades e questionava-me se o problema era a falta de experiência ou a minha AIJ. No meu primeiro estágio, uma enfermeira zangou-se comigo por não lhe ter dito que tinha a doença. Não consegui transferir um paciente obeso, mas, com o tempo, percebi que o problema estava no meu posicionamento e não na minha doença. Hoje, sempre falo sobre a minha artrite com os orientadores e reflito sobre o que posso melhorar.    
A transição para os cuidados reumatológicos de adultos aconteceu de forma gradual e tranquila, pois continuei a ser acompanhada pela mesma médica. A principal diferença foi o ambiente, com pessoas mais velhas, o que causava algum estranhamento, já que eu sou uma jovem de 21 anos. Nas consultas a partir dos 17 anos, por recomendação da minha médica e da ANDAI (Associação Nacional de Doentes com Artrites e Reumatismos na Infância), a minha mãe participou de forma mais discreta, o que facilitou a minha adaptação. Não senti um impacto grande nesta mudança, porque fui bem acompanhada ao longo do processo e tive o suporte necessário para me sentir confortável com o novo acompanhamento médico.
Nas minhas relações amorosas, a minha experiência tem sido que a doença não tem impacto significativo. Quando conheci o meu namorado, senti alguma relutância em lhe contar sobre a minha condição, pois tinha receio de que isso alterasse a perceção que ele tinha de mim. No entanto, essa preocupação revelou-se infundada. Ele aceitou-me tal como sou, e a minha doença nunca afetou o nosso relacionamento. Estamos juntos há seis anos, e, ao longo desse tempo, a AIJ não interferiu na nossa relação, o que me deu uma grande sensação de segurança e aceitação.
Para as crianças com DRME, acredito que políticas públicas poderiam melhorar as oportunidades, como garantir que a avaliação de educação física seja adaptada às necessidades dessas crianças e que as escolas sejam mais próximas de casa, reduzindo o impacto da rigidez matinal. Além disso, é importante garantir que as crianças com DRME possam viajar de transportes públicos com mais facilidade, sem a dificuldade de andar de pé, já que a doença é invisível.
A literacia em saúde também é fundamental. Muitas vezes, somos mal interpretados, com pessoas a achar que estamos a ser preguiçosos ou que a DRME afeta apenas idosos. Precisamos de mais informação e apoio para lidar com a doença. Além disso, defendo que as consultas e exames sejam mais flexíveis para que as crianças não percam aulas e os pais não precisem faltar ao trabalho.
Um dos maiores desafios que enfrentei foi o estigma e a falta de compreensão sobre a DRME. Muitas pessoas não sabem o que é a doença e, por isso, tendem a minimizar as nossas dificuldades. Gostaria que houvesse mais informação disponível para o público em geral e que se perceba que, mesmo com uma doença crónica, as crianças com DRME têm o direito de brincar e aprender como qualquer outra criança.

Bruna Correia, 2024
21 anos, Artrite Idiopática Juvenil

Moro em Lisboa, Portugal.
Vivo com os meus pais sendo filha única.
Estou a estudar Enfermagem na Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa – Lisboa onde frequento o 3º ano.
Tive conhecimento do Prémio Edgar Stene pela LPCDR pois sou voluntária e secretária-geral da ANDAI (Associação Nacional de Doentes com Artrites e Reumatismos na Infância) onde divulguei o prémio para o público-alvo.
Decidi desafiar-me a participar para divulgar a minha história e as minhas percepções da vida com AIJ.

(texto conforme o original)