icon-facebook  icon-youtubeicon-instagramicon X site

Joana Cardoso

"Time is joint - Joints over time"
Diagnóstico precoce e acesso a cuidados de saúde nas doenças reumáticas e músculo-esqueléticas - o mundo ideal e a realidade: a minha história pessoal

Joana CardosoSou a Joana Cardoso. Completo 33 anos no próximo mês, dezembro. A Artrite Reumatoide Juvenil acompanha-me desde os 18 meses de idade. Sempre disse que crescemos juntas. Aprendemos mutuamente. Ultrapassamos obstáculos. Enfrentamos preconceitos. Diariamente damos as mãos uma à outra.
Ao longo de 32 anos vi o meu corpo a deformar-se lentamente. Apercebi-me da perda de alguns movimentos. Movimentos tão simples como rodar uma maçaneta, escovar o cabelo, calçar umas meias, espalhar um creme pelo rosto. Num dia era uma menina que me conseguia sentar na calçada juntamente com os meus amigos. No outro restava-me ficar de pé. Restava-me arranjar qualquer outra alternativa.
A minha vida tem sido até à presente data uma adaptação ao mundo em que vivo. Acima de tudo aprendi ao longo da minha jornada a respeitar-me; respeitar as minhas dores, respeitar as minhas limitações, respeitar aquilo que a ARJ me impõe.
Passei pelos meus momentos de angústia, frustração, dúvidas, receios. Desviei-me de olhares críticos, preconceituosos. Refugiei-me na minha solidão onde tinha como única companhia as minhas lágrimas.
Porém, cresci. Cresci como qualquer ser humano. Continuo a crescer. Todos os dias são uma aprendizagem para mim. Todos os dias descubro as minhas capacidades de superação, adaptação e persistência. São quase 33 anos de vida. São quase 32 anos de ARJ.
Internamento ainda sem diagnóstico corretoFui internada no hospital de St. António com 18 meses. Apresentava febre altíssima, inchaço no tornozelo direito e manchas vermelhas pelo corpo. Vários exames foram realizados, fui assistida por diversos especialistas, alguns diagnósticos foram traçados. Durante 13 meses andei entre a minha casa e o hospital chegando a ficar internada por 5 meses seguidos. Passei por várias crises febris e as dores eram imensamente terríveis. Dores estas de que não me recordo, mas que tomei conhecimento através dos meus pais. Essa fase foi uma época assustadora para os meus progenitores. Nenhum diagnóstico definitivo me era dado. As incertezas entre os médicos eram muitas. Entretanto, fui transferida para o hospital de S. João por intermédio de um Reumatologista dessa mesma unidade que passou uma vez pelo quarto onde me encontrava internada e suspeitou de imediato tratar-se de um caso de ARJ. Joana CardosoAquando do diagnóstico final explicaram aos meus pais que tendo eu aquela idade a possibilidade de ser portadora desta patologia tratava-se de um caso extremamente raro para a época. Teria feito diferença na minha vida um diagnóstico precoce? A resposta é sim. A minha primeira articulação afetada foi o tornozelo direito como já referido. Durante a fase das dúvidas e sem um tratamento adequado para a minha situação a artrite tomou conta do meu corpo. Hoje tenho uma deficiência de 93%. Todas as minhas articulações estão afetadas por ARJ.
Tenho esta realidade. Sei que muitas dores, muitas deformações, muitas limitações poderiam ter sido evitadas. Contudo, a fase de responsabilizar terceiros já foi por mim ultrapassada. Não devemos viver no passado senão o nosso presente torna-se insuportável e o futuro um destino aterrador.
Passeio à Pala Sra. Cruz do Douro - Porque nos podemos divertir sempre que quisermosFui aprendendo várias formas de lidar com a minha situação. Tenho acesso a cuidados de saúde nomeadamente com reumatologistas, ortopedistas, osteopatas, entre outros. O meu tratamento passa por vários ramos. A fisioterapia desde cedo passou a fazer parte da minha rotina diária. Já realizei algumas cirurgias e aguardo por outras. Não deixarei de partilhar que os meus tratamentos não se baseiam única e exclusivamente pela medicina convencional. Ao longo destes longos anos aprendi que devemos sempre procurar por caminhos que nos levem ao conforto físico e acima de tudo emocional. Não nos devemos nunca limitar à ideia que a artrite é somente uma doença física. Todo um equilíbrio faz a diferença na nossa existência até porque fatores psicológicos menos positivos podem agravar as nossas dores. A minha procura por esse equilíbrio é a responsável por eu me encontrar onde hoje estou. Sou uma pessoa que decidiu enfrentar os receios, Um dia no parque Magiklad - Penafielsou alguém que aprendeu a lidar com a artrite de frente. Sou uma pessoa que se decidiu adaptar a um mundo que não está nem de perto e nem de longe adaptado a nós, à deficiência, seja ela física ou não. Para conseguir conhecer-me melhor decidi que viver sozinha seria o melhor ponto de partida. Sem apoio de terceiros as minhas dificuldades diárias acabaram por se transformar em ações de força e de compreensão sobre quem sou e sobre o que consigo e não fazer. Para além desta decisão muitas outras foram tomadas na minha vida e muitas outras estão por vir. Não me rendo ao que não me é permitido fazer. Celebro todas as minhas vitórias.
Não idealizo um mundo perfeito, mas não posso negar que ambiciono por um mundo onde a equidade esteja presente acima de tudo no coração de todas as pessoas; onde todos os nossos direitos se adaptem a cada caso específico com o intuito de vivermos numa sociedade mais justa. De momento esta situação que idealizo ainda não é uma realidade, pelo menos, em grande parte do mundo. Há muito a fazer, há muito conhecimento a levar às pessoas, há muito preconceito para eliminar e acima de tudo há muita deficiência para transformar em eficiência. Cabe a cada um de nós – e não só – trabalhar por essa transformação. Uma mudança que deve começar no nosso interior, uma mudança que será depois visível no nosso exterior. E mudança essa que se tornará na tal transformação projetada.

Joana Cardoso, 2016
33 anos, Artrite Reumatóide