Ensaio de Paula Nunes
Assumo o comando da minha vida: coopero com os profissionais de Saúde para alcançar os meus objectivos
“oh não… as minhas mãos…!”, pensou Nanda ao acordar quando as sentiu rígidas, inchadas e com dor.
Quando se mexeu, reparou que não eram só as mãos que estavam nesse estado. Os joelhos também não estavam muito bem, assim como um cotovelo e um ombro. Logo hoje, que se tinha proposto fazer tanta coisa….
Respirou fundo, fez de tudo para manter a calma e tentou reunir todas as suas forças para fazer frente ao que a esperava.
Nanda tinha uma criança pequena e estava a cuidar da mãe. Por mais que lhe apetecesse ficar a repousar, tinha de se levantar, tomar banho, vestir, pentear, comer, tomar a medicação, ir acordar o filhote, levantá-lo, vesti-lo, dar-lhe comer, levá-lo ao infantário, tratar da mãe… Tanta coisa!!! Parecia uma lista interminável de tarefas, quando o corpo lhe pedia para ficar quieta a fim de não sentir dor… Só de pensar nesta lista, parecia que ficava ainda com mais dores e altamente cansada. Mas não era altura de lamentações. Era altura de fazer sair de si a guerreira e lutadora que desde pequena se habituara a ser…
Engraçada e curiosa a vida… Quem não conhecesse a Nanda por dentro e a visse só por fora, via nela uma pessoa frágil, demasiado frágil e tinham pena dela. Foi assim que ela cresceu, com esse olhar dos outros em cima dela, inclusive dos pais e irmã que sempre a viram como uma condenada e que nada conseguiria da vida por ter o enorme fardo da artrite em cima dos ombros.
No entanto, Nanda decidiu vir a este Mundo mostrar que nada disso era verdade!
Sim, tinha artrite! Sim, sofreu muito desde pequena ao ponto de se criarem deformações pelo corpo e de ter perdido o andar em pequena (recuperou mais tarde, felizmente)! Sim, sofreu e sentia-se humilhada cada vez que ouvia ou sentia dirigirem-se a ela com ar de pena e dizendo “coitadinha” quando nem percebia ao certo porque o diziam! Sim, além dos males físicos teve também de lidar com a crueldade das outras crianças na escola face às suas diferenças e limitações. Sim, a vida não lhe foi propriamente fácil, mas quem tem uma vida fácil? Além disso, a vida não se resumia apenas a isso…! Havia muito mais!Nanda sempre acreditou que a vida era bela, que tudo era perfeito e que ela era praticamente igual aos outros, pois diferenças e limitações todos temos de uma maneira ou outra; e que conseguia fazer tudo o que eles faziam… e se não conseguisse, adaptava e acabava por lá chegar! Em momento algum se sentiu diminuída por ter artrite e fazia de tudo para chegar onde os outros chegavam.
Houve quem acreditasse que ela nunca iria conseguir tirar a Carta de Condução, não iria casar ou ter filhos, nunca iria conseguir ser feliz e ia sempre depender de outros…
Para admiração de muitos, não só tirou a Carta de Condução, como teve vários namorados, arranjou emprego, fez uma vida normalíssima, casou, teve uma gravidez fantástica, teve um filho lindo e ainda cuida da mãe.Ela podia muito bem ter ido atrás do “coitadinha, não sou capaz…”, mas Nanda nunca se acomodou. Esse nunca foi o objetivo da vida dela. Muito pelo contrário! Nanda sempre assumiu o comando da sua vida e nunca o deixou nas mãos de ninguém! Claro que para isso contou com a preciosa ajuda dos fantásticos profissionais de saúde que foi encontrando no seu caminho, para a ajudarem a cumprir a missão que a trouxe a esta vida:
Nanda tem a clara noção que se não fossem eles, hoje poderia estar condenada a uma cadeira de rodas ou sabe-se lá o que seria feito dela… Mas graças a Deus nada disso aconteceu. Apesar das limitações que tem, das 2 próteses nas ancas e das suas raras crises, Nanda faz uma vida normal. É por isso que agradece à Vida/Universo por sempre lhe ter dado força e coragem para seguir em frente e lhe terem aparecido no caminho profissionais de saúde que sempre deram o seu melhor e a ajudaram a ir fazendo a sua vida normal, como sempre desejou.Estão sempre presentes na mente de Nanda, 2 dos grandes milagres que aconteceram na sua vida. Esses milagres ocorreram quando as suas ancas (uma de cada vez) foram piorando progressivamente ao ponto de quase não poder andar, e de verdadeiros Anjos (como considera as equipas médicas que a seguiram na altura) lhe terem dado a oportunidade de ter umas “pernas novas”. Sim, era essa a sensação que tinha com as 2 próteses internas que lhe tinham metido para lhe resolver o problema. E que maravilhosa solução, que superou em grande, toda e qualquer expectativa que Nanda pudesse ter. Nanda ficou eternamente grata a esses Anjos e à Vida.
Estas ajudas deram ainda mais força para que Nanda continuasse o caminho a que sempre se propôs, ou seja, apesar de ter artrite e alguns momentos menos bons devido a este problema, juntamente com os profissionais de saúde que a seguem, vai fazendo de tudo para ter uma vida normal e provar a todos que não é nenhuma “coitadinha”.É por isso que Nanda não se permite desanimar com as crises e com as dificuldades que possam ir surgindo. Afinal, se metermos na balança, dum lado os momentos menos bons; e do outro lado os momentos bons, as ajudas sobretudo dos profissionais de saúde que não a deixam cair, os desejos cumpridos e tudo o mais que daí advém, com certeza que este ultimo “prato da balança” é o que pesa mais…
É por isso que apesar da rigidez matinal que sentiu ao acordar e dos primeiros pensamentos de desânimo, Nanda vai buscar mentalmente as coisas positivas da sua vida, enche-se de coragem, e com muita calma levanta-se e vai fazendo o que tem a fazer, seguindo religiosamente os conselhos de um dos seus Anjos (médico reumatologista que a segue) em casos de crise. Ajuda muito saber que vai passar, pois confia nos médicos, e isso é um alento muito grande.
Nanda é uma pessoa feliz porque sabe que não é a artrite que a tem, mas sim ela que tem a artrite, daí que de certa forma e até certo ponto, a artrite só vai até onde ela e os profissionais de saúde deixarem, desde que ela não perca a força de vontade, fé e determinação e isso ela não vai perder porque sabe que mesmo com dificuldades vale a pena estar no comando da vida!
Paula Nunes, 2014
40 anos, Artrite Idiopática Juvenil