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Maria Luisa Gonçalves

O meu empregador ideal
Trabalho sem barreiras para pessoas com
doença reumática e músculo-esquelética

Luísa GTrabalhar vai para além do ganha-pão: a realização pessoal e profissional, a responsabilidade e o relacionamento interpessoal, são partes essenciais para a minha vida, fazendo sentir-me útil e encontrar sentido para os meus dias.

Sou portadora de Síndrome de Sjögren, doença auto-imune, crónica, do foro reumatológico, que viria a revelar-se após o falecimento da minha mãe, há dez anos. Esta doença não acarreta risco iminente de vida, mas sei que terei que (con)viver com ela o resto da minha vida, sabendo que a secura nos olhos e na boca, a fadiga crónica e as dores articulares estarão sempre presentes. Todo o cortejo sintomático que foi ocorrendo, mudou muita coisa na minha vida. Não é fácil conciliar o trabalho com as dores e esta fadiga extrema que não passa com uma boa noite de sono. A forma de encarar o problema é determinante. Quantas vezes não existe conexão entre a mente e o corpo, sim, é verdade! A mente pede uma coisa mas o corpo exprime outra. Tento sempre viver com coragem. Coragem de ser o que sou, com todas as minhas particularidades, mesmo aquelas que ninguém compreende (por falta de conhecimento/sensibilização para esta doença), e aquelas que são subestimadas porque o impacto que a dor tem não é sentido nem valorizado, de igual forma, por pessoas diferentes.

No meu local de trabalhoO meu empregador ideal é aquele que consegue oferecer-me uma melhor qualidade de vida, aceita-me e respeita-me nos aspetos físico e psíquico, logo, respeita as minhas limitações. Tenho plena consciência do quão incapacitante é esta doença. Todavia, é necessário aceitá-la e aprender a viver a vida com ela, da melhor forma possível. A aceitação passa por fazer adaptações e alterações em nossas vidas. Afinal, não é o que precisamos de fazer, sempre que um obstáculo nos surge pela frente? Há quatro anos, atendendo à fadiga extrema que me assolava, diariamente, tive necessidade de pedir transferência de serviço, porque as deslocações que fazia para chegar ao meu local de trabalho, estavam a tornar-se muito penosas. Como se depreende, Sjögren mudou a minha vida, mas tive a sorte de conseguir aproximar-me da minha área de residência, deixando de fazer quarenta quilómetros diários, para passar a fazer cinco, melhorando assim a minha qualidade de vida, nomeadamente nas alturas de crise.

Em famíliaO meu empregador ideal é aquele que consegue um melhor conhecimento e compreensão das minhas particularidades e procura soluções com a finalidade de reduzir os fatores de risco inerentes à minha profissão. A enfermagem foi a profissão que escolhi, já lá vão trinta e dois anos. É realmente uma das profissões de risco, em que, durante o exercício profissional podem surgir lesões músculo-esqueléticas que resultam da ação de fatores como a repetibilidade, a sobrecarga, e/ou a postura adotada no trabalho que está a ser realizado. Há cerca de um ano, o Núcleo de Saúde Ocupacional fez o estudo do meu posto de trabalho, nomeadamente a avaliação do comportamento postural através de observação direta e com recurso a imagens, sendo que, para a determinação do risco, foi aplicado o método de análise ergonómico REBA (Rapid Entire Body Assessment), que tem como principal objeto de análise as exigências posturais assumidas na realização das tarefas. Foi, também, aplicado o método ROSA (Rapid Office Strain Assessment) que pretende identificar as áreas prioritárias de intervenção no trabalho. Perante esta avaliação, foram feitos pequenos ajustes visando a melhoria no meu posto de trabalho, contribuindo, desta forma, para a redução dos fatores de risco, minimizando desse modo, a ocorrência de lesões músculo-esqueléticas.

À espera de um mundo melhor - sem barreirasGosto da profissão que escolhi, gosto do que faço e espero cumprir sempre, com zelo e brio profissional, as tarefas que me são incumbidas, embora haja dias em que, levantar-se para ir trabalhar, seja um grande desafio o qual passa também por dissimular o mal-estar e sofrimento que persiste ao longo da jornada de trabalho. Tentarei sempre viver com coragem, e não quero que esta coragem me abandone nunca, para não me sentir triste nem derrotada, pois esta doença requererá sempre uma abnegada resposta, disciplina e um grande esforço.

Este mundo seria muito melhor se todos os empregadores permitissem que todas as pessoas com doenças reumáticas e músculo-esqueléticas pudessem trabalhar sem barreiras e facultassem condições, nos seus postos de trabalho, conferindo assim, uma melhor qualidade de vida. Outras dimensões que considero relevantes seriam a flexibilidade do horário de trabalho e até mesmo redução do mesmo (sem perda remuneratória). No entanto, este último aspeto já não depende dos empregadores, tratando-se de entidades públicas, mas sim das políticas governamentais.

Maria Luisa Gonçalves, 2018
54 anos, Síndrome de Sjögren

Decidi participar para poder partilhar a minha experiência, uma vez que todos temos experiências únicas que ninguém mais possui, podendo, assim, ser de alguma utilidade para outras pessoas que têm este ou outro problema do foro reumatológico. Pretendo ainda mostrar que podemos levar uma vida ativa, tendo sempre uma atitude positiva, apesar da doença e das adversidades que vão surgindo ao longo da nossa vida. As doenças são sempre vividas de forma subjectiva, mas a partilha ajuda-nos em duas dimensões: a auto-reflexão e a disseminação de atitudes positivas. Em qualquer dos casos, sempre enriquecedora.